Por
Daniel Motta, População paga o preço com educação de má qualidade, saúde
precária e falta de estrutura nas cidades
De tudo
o que a corrupção retira da sociedade, menos de 5% é ressarcido, segundo o
desembargador do Tribunal de Justiça da Paraíba e coordenador do Mutirão Meta
18, Aloisio Bezerra. A população é quem paga o preço, sendo obrigada a conviver
com problemas, como educação de má qualidade, saúde precária e aumento da
miserabilidade, presentes em muitos municípios do Estado. “Quando ocupam os
cargos, os gestores geralmente declaram que não possuem bens e depois investem
os recursos públicos em negócios que são colocados em nomes de terceiros, para
que não sejam descobertos. Por conta disso, é difícil identificar para onde os
recursos foram desviados. O enriquecimento ilícito do gestor demonstra que ele
está usando o dinheiro público e, quando condenados, muito pouco acaba sendo
ressarcido. Estimamos que de tudo que é desviado, só volta aos cofres públicos
algo em torno de 3% a 5%, o que não representa quase nada diante do que é
roubado”, explicou o juiz. Conforme o procurador-chefe da Advocacia Geral da
União (AGU) na Paraíba, Fabio Leite de Farias Brito, de dezembro de 2012 a
novembro deste ano, foram ajuizadas pelo órgão, 66 ações, que resultaram em
débito de pouco mais de R$ 3 milhões. Mesmo assim, os acusados ainda não
executaram os pagamentos. Segundo o procurador, além de desviarem os recursos,
quando são cobrados os valores para ressarcimento, os responsáveis ainda
atrasam. “Há uma dificuldade muito grande por parte dos devedores em saldar as
dívidas, porque é difícil por conta da ausência de patrimônio. Eles maquiam o
patrimônio, colocam os bens em nome de terceiros. Mas o Estado em busca de
combater a má gestão. Os órgãos que atuam na fiscalização e no combate têm
trabalhado e alcançado bons resultados”, frisou o procurador Fábio Leite. O
chefe da Controladoria Geral da União (CGU), Fábio da Silva Araújo, afirma que
desde que o Programa de Fiscalização através de sorteios foi criado, em 2003,
já foram auditados recursos na ordem de R$ 667 milhões em 83 municípios, alvos
de denúncias de má administração do dinheiro público. Ele ressalta que as áreas
de saúde, educação e infraestrutura são as mais afetadas pela corrupção, por
conta dos recursos que são maiores. “A corrupção é praticamente
inquantificável. É uma situação complexa, que torna o trabalho de fiscalização
dificultoso. É uma área sensível. Existem pessoas que desviam muito dinheiro, e
o que temos feito é intensificar as fiscalizações, não somente através dos
sorteios, mas também as denúncias que chegam”, destacou. PF: mais corruptos do que
traficantes: Se os
órgãos de fiscalização e combate à corrupção sentem dificuldades para combater
o crime, a Polícia Federal também encara o desafio de descobrir e indiciar
gestores corruptos. “Porque se tratam de crimes envolvendo pessoas que são
responsáveis por receber e aplicar os recursos públicos. É difícil para a
polícia identificar a corrupção, mas as investigações têm avançado muito.
Atualmente, as maiorias dos inquéritos instaurados e em andamento são, em
maioria, por crime de corrupção. É ainda maior do que o número de inquérito por
tráfico de drogas”, disse o superintendente da PF na Paraíba, delegado Nivaldo
Farias de Almeida. Para o fundador e secretário-geral da Associação Contas
Abertas, Gil Castello Branco, os gestores corruptos buscam alternativas para
driblar a fiscalização para que não sejam descobertos e uma das mais comuns é o
descumprimento da Lei de Acesso à Informação e Transparência, que determina que
cada órgão gestor, disponibilize um portal de informações, com os dados
necessários sobre recursos recebidos e os investimentos que são feitos. Um
levantamento do Focco apontou que até abril deste ano, apenas 49 dos 223
municípios já haviam criado um portal. “Tem que ter o portal e não apenas um
site com informações da vida do gestor e informações que beneficiem a ele.
Muitos municípios no país descumprem a lei e não disponibilizam os portais. Em
outros, há o portal, mas a qualidade não é boa. Muitos gestores alegam que não
têm recursos. Na verdade, não há um interesse, para que a sociedade não tenha
conhecimento, para cobrar e fiscalizar”, contou Gil. Rombo
em Caldas Brandão: Caldas Brandão, no Agreste, amarga as
consequências da corrupção. Em 2012, a fiscalização da CGU constatou problemas
em todas as áreas da gestão municipal. Na Ação Social, famílias carentes não
tinham acesso ao Bolsa Família, mas funcionários municipais e de empresas
privadas de João Pessoa recebiam o benefício. Na educação, o órgão identificou
que recursos do Fundeb eram desviados para outras finalidades e a merenda
escolar não chegava às escolas. Na saúde, a CGU identificou desvio de mais de
R$ 66 mil. O ex-prefeito João Batista Dias, que governou por dois mandatos
é investigado pelo MPF, foi apontado pela CGU como responsável por fraudar
licitações e concurso público para favorecimento pessoal. Ao ser derrotado nas
eleições passadas, o ex-prefeito deixou o município com uma dívida superior a
R$1,5 milhão. “Quando assumimos em janeiro, não tinha nenhum centavo em caixa,
havia uma dívida milionária e problemas para celebrar convênios”, disse a
prefeita Neuma Rolim. O ex-gestor ainda deixou servidores sem receber o salário
de dezembro de 2012 e o 13º. “Foi um prejuízo grande na minha vida. A pessoa
passa o ano trabalhando honestamente pra receber um salário mínimo e quando
chega o fim do ano nem recebe salário e nem o décimo. Tive que fazer empréstimos
para pagar as contas e comprar comida para meus filhos, porque o prefeito
desviou o pagamento para a conta dele na época”, lamentou a auxiliar de
serviços gerais, Maria do Livramento Silva, 51. O vigilante João Carlos de
Oliveira, disse que além de não receber salário foi surpreendido com o
contracheque debitado, como se tivesse recebido os vencimentos. “O próprio
prefeito foi ao banco e transferiu os recursos da saúde para conta e depois
sacou tudo e não se sabe para onde mandou o dinheiro. Foi constrangedor ver
meus filhos passando necessidade”, desabafou. Sem esgotamento sanitário, os
moradores convivem com esgoto a céu aberto. Na maioria dos bairros, não há
pavimentação. Embora o ex-gestor tenha feito uma nota de empenho alegando
investimentos de mais de R$ 100 mil para calçamento das avenidas.
Portal Correio da Paraíba,
08/12/2013
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