O deputado Luiz Couto (PT-PB) disse na segunda-feira (25/2), em pronunciamento
na Câmara Federal, que a seca tem um forte conteúdo cultural por causa dos
aspectos políticos, desafios técnicos e, principalmente, dos discursos
impregnados de sofismas, de silêncios, de significados obsoletos e
interesseiros para uma parte das elites regionais. Portanto, “não se resume à
ausência de chuvas e escassez de água e prejuízos decorrentes”. Couto ressaltou
que a cultura da seca permanece arraigada em alguns setores da sociedade
nordestina, particularmente nos meios políticos partidários, em segmentos da
imprensa e da mídia em geral. Para ele, as falas nos meios políticos,
repercutidas sem a devida crítica pelos meios de comunicação, repetem-se há um
século e mais atrapalham do que contribuem para a superação “do que chamamos de
cultura da seca”. Segundo o parlamentar, problema dos efeitos da estiagem e a
sua resolução continuam sendo localizados fora do alcance das pessoas mais
afetadas. “Pelo visto e pelo dito por políticos e jornalistas, ao povo resta se
lastimar dos prejuízos, culparem os governos federal e estadual e assinar
abaixo-assinados para reclamar soluções aos poderes públicos”, acrescentou. Luiz
Couto indagou se setores da política nordestina e da opinião pública vão
insistir nos velhos discursos. Perguntou se há disposição para fazer avançar
uma abordagem nova para a questão da seca. Quis saber acerca do compromisso de
todos e de cada um em assumir deveres para com o semi-árido. Por fim,
questionou: “será que sairemos da seca atual com a mesma mentalidade de antes?”
(Confira pronunciamento na íntegra:)
LUIZ COUTO (PT-PB. Pronuncia o seguinte discurso.) - Senhor Presidente,
Senhoras Deputadas e Senhores Deputados. Estamos há quase dois anos convivendo
com uma das maiores estiagens no semi-árido brasileiro. À falta de chuvas
acrescente-se a destruição da lavoura da palma com a cochonilha do carmim,
agravando ainda mais a situação de perdas econômicas dos agricultores e
criadores dos sertões. Mas, como já tratamos aqui em outras oportunidades, a
seca não se resume à ausência de chuvas e escassez de água e prejuízos
decorrentes. A seca tem um forte conteúdo cultural, por seus aspectos
políticos, por seus desafios técnicos e principalmente por seus discursos
impregnados de sofismas, de silêncios, de significados obsoletos, mas ainda
interesseiros para uma parte das elites regionais. A cultura da seca continua
arraigada em alguns setores da sociedade nordestina, principalmente nos meios
políticos partidários e em segmentos da imprensa e da mídia em geral. Às
agruras da recente estiagem nos sertões, soma-se a renitência de um discurso
que nunca ajudou a população na busca de soluções para conviver com este
acontecimento cíclico. As falas nos meios políticos, repercutidas sem a devida
crítica pelos meios de comunicação, repetem-se há um século e mais atrapalham
do que contribuem para a superação do que chamamos de cultura da seca. Um forte
elemento da cultura da seca do Nordeste é a vitimização do povo sertanejo,
raramente visto como protagonista das continuidades e das descontinuidades nas
estruturas econômicas, no espaço geográfico e no processo histórico. O problema
dos efeitos da seca e a sua resolução continuam sendo localizados fora do
alcance das pessoas mais afetadas pelo fenômeno recorrente. Pelo visto e pelo
dito por políticos e jornalistas, ao povo resta se lastimar dos prejuízos, culparem
o governo federal e Estadual e assinar
abaixo-assinados para reclamar soluções aos poderes públicos. No desespero dos
segmentos populacionais afetados pela ruína da seca ninguém tem motivação para
aprofundar minimamente o olhar sobre tal situação. A busca de soluções
redentoras mais confunde do que ajuda a entender o desafio que precisa ser
enfrentado: O desafio do desenvolvimento sustentável da região. Tomemos a
título de exemplo a situação da agropecuária no Estado da Paraíba na última
década (entenda-se aqui agropecuária e não agronegócio). Segundo os estudos do
IPEA, em 2002 a participação da agropecuária na formação do Produto Interno
Bruto da Paraíba foi de 7,58% (sete vírgula cinqüenta e oito por cento),
enquanto que no ano de 2008 o mesmo setor primário contribuiu com 6,10 % (seis
vírgula dez por cento) na formação do PIB estadual. Esta redução na
participação do PIB deve-se a uma forte queda na produção agropecuária em 2007.
Esses números são muito próximos dos números do país, onde a participação da
agropecuária no PIB brasileiro em 2008 foi de 5,92%. Mas é preciso deter-se
melhor nas peculiaridades da vida no meio rural da Paraíba. Em termos
demográficos, enquanto no Brasil 15,6% da população habita na zona rural, esse
percentual sobe a 24,6% na zona rural da Paraíba (IBGE, 2010). Se considerarmos
que na maioria das cidades paraibanas, notadamente nas pequenas cidades, há um
grande número de pessoas que trabalham no campo, a relação entre a ocupação da
população economicamente ativa e a agropecuária abrange um percentual bem maior
de paraibanos. Ou seja, o peso relativo do número trabalhadores vivendo da
agropecuária na Paraíba é bem mais elevado do que no Brasil. Entretanto, outro
aspecto é gritante na Paraíba: Segundo o IPEA a renda dos paraibanos e
paraibanos na zona rural apresenta números muito desfavoráveis no contexto do
próprio estado. Em 2009, enquanto a renda familiar per capta na Paraíba
era de R$ 422,9 ao mês, na zona rural a renda familiar per capta era de apenas
R$ 226,2. Se o parâmetro for o índice de extrema pobreza (para quem dispunha de
menos de R$ 67,00/mês), a situação não é melhor: enquanto no conjunto do Estado
10,4% de paraibanos estavam na miséria em 2009, este percentual saltava para
15,1 % na zona rural. Em suma, faça chuva ou faça sol, o setor da agricultura e
da pecuária na Paraíba concentra os piores índices de miserabilidade do Estado.
Tudo isto num quadro mais geral em que a população da Paraíba representa
aproximadamente 2% da população do Brasil, enquanto que o PIB estadual não
alcança 1% do PIB nacional. Neste contexto de subdesenvolvimento mais acentuado
de um pequeno estado nordestino num país que ainda carrega chagas de nação
subdesenvolvida, a seca é um sério agravante, mas não é o problema maior. O
desafio do semi-árido é mais abrangente do que a sua natureza. As ações
emergenciais amenizam, apenas em parte, os efeitos destruidores da seca. O povo
nordestino quer é a consecução das grandes obras de transposição de águas entre
bacias hidrográficas, bem como a continuidade e expansão do trabalho em rede
para pequenas grande obras coordenadas ou inspiradas pela ASA. Para que a água
chegue e tenha bom uso em todos os quadrantes do sertão. Mas e os sertanejos?
Os sertanejos estão prontos para dar um salto de qualidade no jeito de ser e no
jeito de viver na região? É preciso indagar a determinados setores da política
nordestina e a autoproclamada opinião pública se ainda vão insistir com o
anacronismo dos seus velhos discursos? É preciso perguntar sem meias palavras
aos conterrâneos e conterrâneas se há disposição para fazer avançar uma
abordagem nova para essa velha questão da seca? Que papéis cada sertanejo devem
cumprir neste cenário? Para além dos direitos, que disposição e compromisso há
de todos e de cada um de assumir deveres para com o semi-árido? Ou será que sairemos
da seca atual com a mesma mentalidade de antes? Era o que tinha a dizer. (Ascom Dep. Luiz Couto)
Fonte: ACESSE www.luizcouto.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário