Durante dois dias, agricultoras de diversas regiões da Paraíba,
representantes dos territórios e dinâmicas da Articulação do Semiárido
Paraibano (ASA Paraíba), estiveram reunidas partilhando experiências e
histórias de superação no “I Encontro Estadual de Agricultoras Experimentadoras
da Paraíba”, nos dias 03 e 04 de setembro, no Convento Ipuarana em Lagoa
Seca-PB.
A programação foi aberta na
manhã do dia 03 com uma mística que trouxe a valorização do conhecimento das
agricultoras mais velhas, sendo repassado através das gerações.Dona Odete Maria da Costa, de 69 anos, do município de Tacima, a agricultora experimentadora mais velha do evento, segurou a vela que foi acendendo as demais velas, repassando a luz que simbolizou o conhecimento sendo repassado das mais velhas até as mais novas do evento, jovens participantes como Gabriela dos Santos Galdino, de 18 anos, do município de Massaranduba.
Roselita
Vitor, do Polo da Borborema, falou sobre os objetivos e o sentido do evento.
Ela lembrou que o encontro é realizado em um ano muito especial, quando a ASA
completa 15 anos de atuação e no mês em que a Paraíba vai receber o Encontro
Nacional de Agricultoras Experimentadoras, no final de setembro:
“As mulheres
do Semiárido tem muita história para contar. Nesse encontro nós vamos ouvir
muitas destas histórias. Esse momento serve pra avaliar até onde a gente andou,
ver as nossas conquistas, mas também os desafios que estão colocados.
Precisamos sair daqui sabendo para onde a
gente vai, qual o nosso caminh O primeiro debate foi provocado à partir da
exibição do filme “A vida de Margarida”, um vídeo-teatro produzido pela AS-PTA
Agricultura Familiar e Agroecologia e pelo Grupo de teatro amador do Polo da
Borborema. O vídeo mostra um dia na vida de Margarida, uma mulher que, junto de
sua filha, sofre vários tipos de violência por parte do marido e do filho. Após
o vídeo as mulheres foram provocadas:
“Aqui e nos
nossos territórios a gente ainda tem muitas Margaridas?”, “E Bius, ainda
existem muitos na sociedade?”. Uma sucessão de depoimentos emocionados
dialogavam com as duas perguntas. Muitas mulheres foram às lágrimas ao
lembrar-se das situações de violência e opressão que viveram, algumas ficaram
no passado, outras ainda estão presentes.o para nos fortalecermos
enquanto mulher”, disse.
A agricultora
Raimunda Gomes Soares, do Assentamento Lajedo, município de Tacima foi uma das
mulheres que deu o seu depoimento: “Da violência psicológica e moral que vimos
no vídeo, a mulher não se cura nunca.
As marcas ficam pra vida toda. Uma vez eu fui
participar de um encontro e quando voltei, fui expulsa de casa, com sete meses
de gravidez”, contou. “Eu já fui uma Margarida, mas hoje me libertei. Meu
marido ainda é quase um Biu, mas só que agora eu não tenho mais medo dele”,
afirmou Maria Isabel do Livramento, do Sítio Pedra Grande, município de
Solânea. Maria Betânia Alves, do Sítio Canoa de Dentro, Cubati, fez uma
avaliação dos depoimentos que ouviu:
“Cada uma de
nós tem um pouco de Margarida. Às vezes a gente se liberta do marido mas, e da
sociedade, a gente já se libertou? A gente vai participar de um encontro e o
povo ‘lá vai a mulher de fulano colocar chifre no marido’. Então infelizmente a
gente ainda é obrigada a viver com esse tipo de pensamento”, desabafou a
agricultora.
a parte da
tarde foi feita uma discussão sobre a divisão de trabalho dentro da propriedade
e a invisibilidade ou desvalorização do trabalho da mulher. Em um painel
pintado com os vários espaços da propriedade, as participantes do encontro
foram convidadas a ir mostrando em quais espaços o trabalho de homens e
mulheres, jovens e crianças estava presente.
“Eu não ajudo o meu marido, eu trabalho, até
mais que ele. Às vezes o cara sai pra trabalhar fora, quando volta encontra a
cisterna toda pronta lá. Foi a mulher e os filhos que fizeram tudo, bateram as
placas, colocaram água, aí na hora de perguntar
de quem é, vai dizer que é do homem?!”, questionou.
Após esse
debate as agricultoras se
dividiram em cinco grupos temáticos, onde aprofundaram os temas: criação animal,
diversificação produtiva de quintais, sementes, manejo da água no arredor de
casa e acesso a mercados. O primeiro dia do encontro foi encerrado com uma
feira de experiências e produtos das mulheres agricultoras e uma noite de
integração com a apresentação da cantora Cida Dyas.
O segundo e
último dia do encontro começou bem cedo, a partir das 6h30 da manhã, quando
começaram a sair os grupos de agricultoras que foram conhecer na prática as
experiências que as mulheres estão construindo nos cinco temas trabalhados nos
grupos do dia anterior. Os locais visitados foram: Sítio Capoeiras em Cubati,
na propriedade de Solange José de Medeiros.
Sítio Cachoeira de Pedra D’água, em
Massaranduba, na propriedade de Maria de Fátima Fernandes Barros; Sítio
Maracajá II, em Queimadas, experiência de Severina Pereira da Silva, a
Silvinha; Sítio Fidelis, na propriedade de Patrícia Fidelis e Sítio Canudos, no
município de Boqueirão, na propriedade de Lourdes Silva Santos.
Luzia da Costa
Sales, do Sítio Gravatá, município de Picuí, conheceu a experiência do banco de
sementes comunitário do sítio Maracajá II, expressou um pouco do sentimento
após a visita: “Foi muito boa a visita, pois aqui eu conheci um tipo de feijão
que na nossa comunidade não existe. Chegando lá eu já vou apresentar e começar
a multiplicar, porque lá o nosso lema é esse”, disse.
o período da
tarde as participantes do encontro foram convidadas a refletir sobre o que é se
considerar uma agricultora-experimentadora. Dona Eliete Santana foi uma das
mulheres a se expressar: “Eu tenho muito orgulho de viverda agricultora, tem gente que tem vergonha de dizer que é
agricultora, eu não. É muito bom estar aqui, aprendendo coisas novas com outras
mulheres para levar para as nossas comunidades”, afirmou.
Após isso, as
mulheres se dividiram por região para indicar duas participantes para o
Encontro Nacional de Agricultoras Experimentadoras que vai acontecer nos dias
23 e 24 de setembro, também em Lagoa Seca-PB. As mulheres também discutiram o
que iriam levar para os seus territórios e sobre a missão de envolver novas
mulheres nesse trabalho.
Ao final, a
plenária se reuniu em círculo, novamente trazendo a vela como símbolo do
conhecimento. As agricultoras foram a repassando como forma de selar o
compromisso de manter viva a chama do desejo de aprender juntas e de
compartilhar saberes e cada vez mais novos exemplos de superação.
Fonte: http://aspta.org.br/
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