As
chances de ganhar já no primeiro turno aumentaram muito. Se resistir às
idiossincrasias do "tripé econômico" reverenciado por Marina Silva. A presidente Dilma Rousseff deu a
volta por cima. Para quem apostava nas suas deficiências de virtude e fortuna –
as duas qualidades fundamentais para um governante que se pretenda condutor dos
destinos de um povo, segundo Maquiavel – suas respostas às manifestações de
junho, e os fatos que se sucederam a elas e antecederam ao prazo legal final
para filiação partidária dos políticos com pretensões eleitorais, mostram que a
presidenta pode não ser uma Pelé da política, mas é capaz de jogar um bolão
quando se dispõe a entrar em campo. E que a sorte que, no passado, a fez
emergir de um ministério técnico e ser guindada ao principal gabinete do
Palácio do Planalto, não a abandonou. Comprar a briga pelo Programa Mais Médico
foi uma aposta arriscada, pois foi feita no momento em que as bandeiras
empunhadas por milhões de manifestantes eram muito dispersas e existia o risco
de que se confundisse a reivindicação de Saúde Pública de qualidade com os
vetos corporativos das entidades de classe dos médicos. Foi o que
aconteceu, por exemplo, com a jogada do Ministério Público, que conseguiu contrabandear
o veto à PEC 37 na lista de reivindicações populares sem que as pessoas que
arriscaram a pele indo às ruas soubessem o que isto vinha a ser efetivamente.
Desta vez, ao comprar a briga por um programa com razões mais do que justas –
levar médicos estrangeiros para os rincões do país onde os brasileiros não
queriam ir –, o governo acabou expondo a avareza das razões corporativistas e
da oposição ao programa liderada pelas associações médicas. Dilma ganhou porque
insistiu (e devia ter insistido em outras questões), e ganhou marginalmente
devido à incompetência política dos conselhos de medicina. Ganhou mais uma vez,
quando manteve Alexandre Padilha à frente do Ministério da Saúde, identificou-o
com essa briga e depois o liberou para a disputa ao governo do Estado de São
Paulo no próximo ano. Nessa luta eleitoral, certamente deve ter aceitado as
sugestões do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que desde o ano passado
monta cuidadosamente as peças de um jogo destinado a quebrar a hegemonia
tucana no Estado. Desde a primeira vitória eleitoral do partido ao governo do
Estado, em 1998, peessedebista se sucedem no Palácio dos Bandeirantes, e ao
longo deste período conseguiram, com êxito, amoldar um eleitorado, na sua
origem de centro-esquerda, ao programa neoliberal que era comandado pelo
governo central no período FHC. Houve uma intersecção perfeita entre esse
eleitorado intelectual que caiu em depressão (ou se aproveitou da onda) após a
queda do Muro de Berlim e o abraço da socialdemocracia europeia ao
neoliberalismo, e aderiu às teorias liberais como se elas fossem a única
garantia possível de liberdade, e uma elite paulista que estava despossuída de
partidos e convicções no pós-Collor. A “cola” que juntou agentes políticos
antipetistas de diferentes origens em torno do tucanato paulista, um discurso
conservador justificado por um moralismo hipócrita, baseado na máxima de que
governos petistas são corruptos, e os tucanos não o são, aproxima de sua data
de vencimento, com o estouro do escândalo do “propinoduto” do PSDB, enraizado
no setor de transporte de sucessivos governos tucanos, desde o primeiro mandato
de Mário Covas (1998-2002). O governador Geraldo Alckmin, candidato à
reeleição, é parte inseparável do esquema: foi um vice-governador atuante no
primeiro mandato de Covas e assumiu o governo por praticamente todo o segundo
mandato, devido ao falecimento do titular do cargo. As investigações sobre
o escândalo, que se iniciaram no Conselho Administrativo de Defesa da
Concorrência (Cade), embora sejam cuidadosamente publicadas pela grande
imprensa – que dificilmente cita governadores ou o PSDB quando relata capítulos
dessa novela – dificilmente escaparão da campanha eleitoral, cujo início não
está tão longe que apague da memória dos adversários esta mácula. A aliança
montada para eleger como prefeito da capital o prefeito Fernando Haddad, na
medida em que Dilma se consolida como a grande favorita da disputa
presidencial, tende a ser transferida para Alexandre Padilha, já consagrado
como o candidato petista ao governo. Alckmin vai para a campanha eleitoral com
alianças frágeis e um candidato presidencial fraco. Nunca antes, desde a
primeira eleição ganha para governador de São Paulo, o PSDB tem condições tão
desfavoráveis. Sorte de Dilma. Quanto maiores as chances de o PT fazer o
governador de São Paulo, mais ela tem condições de recuperar, com alguma folga,
os votos que pode perder em Minas, com a candidatura de Aécio Neves (PSDB) a
presidente. Sorte dupla é a de Marina Silva ter refluído de sua candidatura
para apoiar Eduardo Campos (PSB). Marina teria maiores chances de subtrair
votos de Dilma em São Paulo e no Rio; Eduardo Campos não terá o mesmo apelo
para os paulistas insatisfeitos com a polarização reiterada das eleições entre
PT e PSDB; e Aécio, um tucano de fora do circuito paulista, chega para disputar
esse voto junto com as denúncias trazidas a público pela Siemens – não é
exatamente o que um eleitorado cultivado pelo PSDB no discurso moralista acha
interessante. No Rio, as chances do PT sobem na proporção direta do desgaste de
Sérgio Cabral – sorte do PT por ter encontrado pela frente o senador Lindberg
Faria, que não recuou de sua candidatura quando Cabral ainda não era cachorro
morto. Agora, dificilmente Cabral pode impor a candidatura de seu vice para o
PT. Em junho, como conseqüência direta das manifestações, ficou arriscada a
aposta numa vitória de Dilma já num primeiro turno. As chances de ganhar já na
primeira votação aumentaram muito. Se resistir às idiossincrasias do “tripé econômico”
reverenciado por Marina Silva e não girar mais o torniquete, o que acabaria
desaquecendo ainda mais a economia. Se mantiver o país em crescimento, mesmo em
ritmo lento, ela chegará ao processo eleitoral com adversários muito fracos e
oposição com argumentos bastante limitados. (Por: Maria Inês Nassif)
Fonte: www.cartamaior.com.br

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