segunda-feira, 16 de março de 2015

Reforma política já!

Fui candidato seis vezes. Em 1982, fui o candidato a deputado mais votado do Partido dos Trabalhadores, não eleito porque o partido não atingiu o quórum mínimo (o voto então era vinculado; quem votava em deputado era obrigado a votar no governador do mesmo partido, e vice-versa).

Fui eleito deputado estadual constituinte gaúcho, com um mandato popular voltado prioritariamente para os problemas urbanos, habitação, participação social e popular, reforma urbana.

Depois, fui mais quatro vezes candidato, mas como sempre digo brincando "o povo (eleitor) não me quis mais”. Nem mesmo meus apoiadores mais próximos, amigos/companheiros/família ‘guentavam’ minha insistência.

Eram campanhas difíceis, mas bonitas, cheias de energia e sonhos. Em 1986, campanha para a Constituinte, no meio de uma grande mobilização social, o hoje senador Paim e eu rodamos o Rio Grande do Sul.

Eu dirigia ‘o velho fusquinha verde de guerra’ (eternizado por Paim numa cartilha na sua campanha a senador), Paim era meu caroneiro. Parávamos nas casas de companheiras/os, ou sindicalistas, ou padres, ou agentes de pastoral, nossa base política, comíamos em suas casas, onde também fazíamos reuniões e debates.

Os recursos para a campanha vinham do próprio bolso, de contribuições voluntárias de apoiadores, ou de alguma promoção (jantas, rifas) entre amigos e militantes (ano passado o então presidente do BANRISUL, Túlio Zamin, lamentou não ter guardado o caderno onde anotava as contribuições como tesoureiro da campanha de 1986).

A vida e os tempos mudaram. Hoje, um candidato como eu, vindo das lutas populares, morador dos vilas populares da Lomba do Pinheiro, sem maiores articulações e conexões, tem muita dificuldade de lançar uma candidatura com chances eleitorais. Como e onde conseguir milhões para se se eleger? Como disse João Pedro Stédile, da direção nacional do MST em entrevista à TV Brasil, "o poder econômico e financeiro sequestrou o Parlamento”.

É preciso mudar. Não se trata de voltar para o que já passou – os tempos são outros, hoje há as mídias sociais, a relação do eleitor com seu representante tem elementos da atualidade, etc. - mas de recuperar a política, os políticos, os partidos para o seu sentido original: a relação com a pólis, a cidade, a sociedade, o bem comum.

Por isso, a reforma política, entre outras reformas, é a mais urgente e necessária. Sem uma reforma política profunda será o caos, diz João Pedro Stédile. E continuaremos vendo as notícias do caixa 2, da corrupção que se generaliza, dos mandatos sequestrados pelo poder econômico, das obras públicas que só acontecem se acompanhadas de propinas.

Na sequência as investigações, seguidas de prisões e CPIs. Resultado: a degradação da política na visão da sociedade, que identifica cada vez mais todos os políticos como ladrões, o que não é verdade. O ministro Miguel Rossetto, da Secretaria Geral da Presidência da República, disse, em reuniões com a sociedade civil:

"É preciso repensar a forma como as campanhas e os partidos são financiados no nosso país, no sentido de fortalecer a capacidade de acompanhamento e de fiscalização da sociedade sobre os eleitos. Nós acreditamos que as organizações partidárias se deem através de grandes projetos ideológicos, das grandes opiniões existentes na sociedade brasileira.

É importante a mobilização da sociedade civil diante da urgência da reforma política. “O fim do financiamento privado aos partidos e às campanhas eleitorais é decisivo para a democracia e a sociedade brasileira.”

De acordo com o ministro Rossetto, além do fim do financiamento privado de campanha, o projeto da Coalizão pela Reforma Política Democrática tem como prioridades a instituição do voto partidário no país, a adoção de uma política forte de gênero.

Que estimule a maior participação das mulheres, além de um conjunto de iniciativas que estimulem instrumentos de democracia direta como plebiscitos, referendos e consultas populares.

Sem reformas estruturantes, que mudem as regras do jogo, estabeleçam limites, o modelo vigente se perpetua, porque não interessa mudar a quem é o dono da bola. Luis Fernando Veríssimo escreveu em ‘Bolsos fundos’: 

"Os maiores interessados em que não vingue uma reforma eleitoral são os que têm acesso aos bolsos mais fundos da nação, e têm mais a oferecer na defesa dos interesses dos maiores pagadores” (O Globo, 12.03.15).

A sociedade brasileira, como fez nas Diretas-Já e na Constituinte nos anos 1980, está se mobilizando. Houve um Plebiscito Popular por uma Constituinte exclusiva pela reforma política, com participação de quase oito milhões de eleitoras/es.

Há uma Coalizão pela Reforma política democrática, recolhendo assinaturas para um projeto de lei de iniciativa popular, com participação de centenas de entidades da sociedade, como CNBB e OAB. Há uma Plataforma dos Movimentos sociais pela Reforma política.

A cidadania livre e consciente, a mobilização social e popular possa, sim, apontar para a esperança e o futuro. E libertar a política, os partidos, os governos das amarras dos sequestros políticos e da corrupção.

De novo, nas palavras de Veríssimo: "Claro que a simples existência de uma lei para controlar a influência do dinheiro na política não vai impedir que ela continue. Estamos, afinal, no país do dá-se um jeito. Mas só coibir e criminalizar a farra já será um progresso.” É um longo caminho, mas não há outra estrada a trilhar. A hora é agora. Selvino Heck.

Fonte: site.adital.com.br

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